1. Dia de Todos os Santos. Deus é a Santidade. Três vezes Santo. Santo, Santo, Santo. Santo, na língua hebraica, diz-se qadôsh, cujo significado mais consistente é «separado». Separado de quê ou de quem, podemos perguntar. Da sua criação? Parece que não, pois o Deus da Bíblia olha para ela e por ela com beleza e bondade. De nós? Obviamente não, pois o Deus da Bíblia bem vê e vê bem os seus filhos queridos, ouve a nossa voz, conhece as nossas alegrias e tristezas, desce ao nosso nível e debruça-se sobre nós com carinho. «Separado» de quê ou de quem, então? «Separado» de si mesmo, eis a surpreendente identidade de Deus. «Separado» de si mesmo, isto é, não agarrado ao seu mundo divino e dourado para o defender ciosamente. Ao contrário, o nosso Deus é um Deus que sai de si por amor, para, por amor, vir ao nosso encontro. É esta realidade que se vê bem em toda a Escritura, Antigo e Novo Testamento. Paulo, na 2 Carta aos Coríntios, resume bem esta realidade ao falar de Jesus Cristo que, «sendo rico se fez pobre por causa de nós, para nos enriquecer com a sua pobreza» (8,9).
2. Só um Deus assim pode e sabe felicitar os pobres. Com um tom carregado de felicidade, não restritivo, mas alargado a toda a humanidade, as «Felicitações» do Rei novo atingem todas as pessoas, chegando às franjas da sociedade, onde estão os pobres de verdade. No meio destas «Felicitações» – é por nove vezes que soa o termo «FELIZES –, note-se a centralidade da MISERICÓRDIA (5.ª felicitação) (5,7). Atente-se ainda na diferente formulação desta felicitação. Salta à vista que todas as outras se abrem a uma recompensa imediata ou futura. A MISERICÓRDIA, porém, roda sobre si mesma, retornando, por obra de Deus (passivo divino ou teológico) sobre os MISERICORDIOSOS. Aos misericordiosos será feita misericórdia. Belíssimo círculo bem no centro das Bem-Aventuranças. Notem-se igualmente as inclusões assentes na repetição da locução «reino dos céus» (1.ª e 8.ª) (5,3 e 10) e do termo «justiça» (4.ª e 8.ª) (5,6 e 10). Estas inclusões convidam-nos também ao reconhecimento de duas tábuas de felicitações, a primeira à volta da pobreza evangélica (5,3-6), e a segunda à volta da bondade do coração (5,7-10).
«5,1Vendo as multidões, subiu à montanha. Tendo-se sentado, vieram ter com ele os seus discípulos. 2Abrindo então a sua boca, ensinava-os dizendo: 3FELIZES (makárioi / ’ashrê) os pobres de espírito (ptôchoì tô pneúmati), porque deles é o reino dos céus; 4FELIZES os aflitos, porque serão consolados; 5FELIZES os mansos, porque herdarão a terra; 6FELIZES os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados;
7FELIZES os misericordiosos (eleêmones),
porque lhes será feita misericórdia (eleêthêsontai); |
3. Os «pobres de espírito», aqui referidos, não são pobres de Espírito Santo nem de inteligência, mas pessoas humildes, no sentido em que uma pessoa humilde é «baixa de rûah» (shephal rûah) (Provérbios 16,19; 29,23), isto é, sem espaço físico, económico, social ou psicológico. Não precisam de se afirmar. São claramente os últimos da sociedade, mas que, na sua humildade e pobreza, desafiam a sociedade, pois os ptochoí são pobres ao lado de gente rica, acomodada, que estendem a mão para nós, apontando o dedo ao nosso egoísmo, afirmação, instalação e comodidade. Situação que, seguramente, não nos deixa de boa consciência, encarregando-se a Constituição Dogmática Lumen Gentium, n.º 9, de nos lembrar que «Aprouve a Deus salvar e santificar os homens, não individualmente, excluída qualquer ligação entre eles, mas constituindo-os em povo». O povo de Deus, a Igreja de Deus, não são alguns tranquilamente instalados, num círculo restrito, mas uma imensa comunhão de irmãos sem paredes nem barreiras de qualquer espécie.
4. É quanto assinala a majestosa multidão dos 144.000 da bela página do Apocalipse 7,2-4.9-14. 144.000, número perfeito e incontável (12 vezes 12 vezes 1000), que traduz todos os redimidos, de todas as raças, nações, povos e línguas, inumerável família dos filhos de Deus, todos com vestes brancas, porque lavadas no sangue do Cordeiro, e que jubilosamente aclamam o Deus Santo. «Somos filhos de Deus e seremos semelhantes a Ele», grande teologia da divinização por graça aportada pela página sempre nova da Primeira Carta de São João 3,1-3.
5. Note-se ainda que, na mentalidade e na língua hebraica, «felizes» ou «bem-aventurados» diz-se ’ashrê, derivação do verbo ’ashar, que significa «pôr-se a caminho». Extraordinária maneira de designar os «bem-aventurados» como pioneiros, aqueles que abrem caminhos novos e bons e de vida nova e boa para o mundo. E é verdade por paradoxal que pareça. Foram e continuam a ser os Santos e os Pobres os que verdadeiramente abrem caminhos novos neste mundo enlatado, saciado, enjoado, dormente e anestesiado em que vivemos.
6. Sim, disse-o no Sínodo, para mim e para todos: por que será que os Santos se esforçaram tanto, e com tanta alegria, por ser pobres e humildes, e nós nos esforçamos tanto, e com tristeza (Mt 19,22; Mc 10,22; Lc 18,23), por ser ricos e importantes?
António Couto
Só podemos ser FELIZES.
Temos a obrigação de ser FELIZES.
Tanto e tão grande é o amor e a graça de DEUS, nosso Senhor.
E também podemos ser Santos, desde que, com um coração puro, nos façamos ao caminho.
Já sentia falta de cá vir.
Bem haja D. António, tudo bem aí por Lamego?
Muito obrigado pelas suas palavras no sínodo dos bispos. Foi uma aplicação desta mesa de PALAVRAS. Meditemos,,,
Olá D. António.
Dia de todos os Santos,que os nossos queridos familiares que já
partiram sejam também Santos.Eram pobres mas humildes davam-nos
educação respeitadora.Eucaristia, doutrina, tínhamos que estar presentes
A nossa presença na Igreja, no cemitério, é um sinal do nosso amor.
As suas palavras nos abrem caminhos novos e belos para este Mundo.
E quando vier a Igreja jovem, bela, acolhedora, onde as pessoas terão
que lutar para entrar nela. Pressinto a sua Santidade.
Até breve.
Obrigado Do. Couto pela sua leitura de Mt. 5,3. Enquanto a Igreja “espiritualizar” a pobreza, nunca será pobre; nunca saberá que a pobreza verdadeira, como disse num curso de verão na universidade católica no Porto o senhor professor Alexandre Duarte, é a daqueles que não têm a possibildiade de experimentar a alegria de poder dar. Obrigado a vós.